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Causa e Efeito | 29.10.2021

Causa e Efeito | 29.10.2021

(Tempo de Leitura: 5 min)

Família Portofino,

É difícil esconder a frustração com a piora recente dos mercados brasileiros. Em um momento que observamos o mundo se recuperando do impacto da pandemia na economia mundial, o Brasil destoa e não se permite surfar essa onda, única e exclusivamente devido às escolhas equivocadas da nossa classe política. A discussão entre os analistas já flerta com comparações aos piores momentos do governo Dilma Rousseff.

Avaliamos como sendo precipitadas algumas comparações, entretanto parecem inequívocas algumas semelhanças. Avançamos em reformas estruturantes. Há de se reconhecer que a Reforma da Previdência aprovada neste governo foi ainda mais agressiva que a anteriormente tentada pelo governo Temer. Projeta-se uma economia de mais de R$ trilhão em 10 anos. Aquém do que se pretendia, é verdade, há avanços nos processos de privatização da Eletrobras e a dos Correios, ainda em um estágio inicial.

Temos também um cenário externo mais benigno favorecendo nossas contas externas com aumento da nossa exportação de commodities tanto no “quantum” como no preço. A alavancagem do setor público e privado é menor e o balanço das empresas e das famílias encontram-se mais saudáveis. Semelhanças? A potencial desancoragem inflacionária e fiscal.

Temos constantemente questionado o quanto desse cenário ainda incerto já foi incorporado nos preços dos ativos. Particularmente na Bolsa, permanecemos mais cautelosos dado que continua complicado prever o impacto dos juros mais altos e da piora das condições financeiras de forma geral sobre o crescimento econômico e sobre o resultado das empresas. Mantemos nosso posicionamento mais cauteloso com uma carteira de renda variável bem mais defensiva quando comparada ao início do ano. Relembrando que aumentamos nossa exposição em bolsas internacionais, Estados Unidos e China principalmente, zeramos posicionamentos direcionais em índices de bolsas locais, Ibovespa e “Small Caps”, e privilegiamos a alocação em gestores de fundos “long biased”. Esses gestores mantêm estruturalmente maior exposição em caixa além de trabalharem com parte dos seus portfólios vendida.

Na renda fixa pós-fixada, mantemos nossa saga em procurar bons créditos privados indexados em CDI + taxa, mas reconhecemos a dificuldade de escalar essa estratégia sem termos que renunciar a retorno ou elevar imprudentemente o risco de crédito. A própria disfuncionalidade do mercado de juros observada recentemente e o receio quanto à materialização de um cenário de estagflação pouco contribuem para que boas empresas acessem o mercado de capitais nesse momento. Como alternativa, temos aumentado nossas alocações em fundos de crédito estruturado que, a despeito do cenário, mantêm suas carteiras com posições bem equilibradas do ponto de vista do risco e retorno. Isso também vale para os ativos indexados em IPCA + taxa.

A novidade está na nossa decisão de iniciar gradativamente um aumento do risco das nossas carteiras em ativos prefixados. Quando analisamos nossa curva futura de taxa de juros já podemos verificar a precificação de aumentos da Selic em adicionais 6%. Confirmada a projeção do mercado, o ciclo de juros só seria interrompido pelo Banco Central por volta de 13,75%. Parece exagerado visto que comungamos com a visão de parte dos analistas que julgam ser suficiente a elevação da Selic para 12% de modo a estabilizar as expectativas da inflação. Esse prêmio adicional de 1,75% aguenta certo desaforo e nos deixa relativamente mais otimistas com a posição. Podemos verificar também poucos fundos multimercados posicionados acreditando na continuidade da abertura da curva corroborado pelo anúncio do Tesouro Nacional de que, em coordenação com o Banco Central, atuará na compra de títulos do mercado caso avalie ser necessário. A assimetria de preços nos parece favorável.

Implementaremos essa estratégia de forma paulatina até porque ainda existem incertezas a serem monitoradas. A votação da PEC dos Precatórios foi mais uma vez adiada para a quarta-feira da próxima semana e sua aprovação se faz necessária para garantir a limitação dos gastos com verbas adicionais para emendas dos parlamentares e com o novo Bolsa Família limitados a cerca de R$ 100 bilhões. A desistência desse caminho poderá suscitar volatilidade adicional nos mercados o que justifica nossa prudência na implementação da estratégia. Do ponto de vista dos ativos, daremos preferência aos ativos isentos de imposto de renda emitidos pelos grandes bancos de modo a adicionar uma proteção extra, contra eventuais pioras do mercado.

Como sempre diz um grande amigo do mercado — “Esse é o nosso Brasil, às vezes enverga, mas não quebra!”. Mesmo com todas as incertezas geradas pela decisão de se flertar com a imprudência nos gastos públicos e macular o guardião do arcabouço fiscal, o teto de gastos, não aventamos a possibilidade de mudança estrutural do regime ou de um estado de dominância fiscal.

Aproveitem o feriado com suas famílias. Descansem, porque semana que vem tem mais!

Edu Castro
Chief Investment Office
Portofino Multi Family Office

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Eduardo Castro é CIO (Chief Investment Office) na Portofino Multi Family Office.

”Causa e Efeito” é um conteúdo exclusivo para clientes Portofino que traz uma visão técnica sobre o que aconteceu no mundo, na semana e seus reflexos nos mercados financeiros globais.

Causa e Efeito | 22.10.2021

Causa e Efeito | 22.10.2021

Tempo de leitura: 3 mins.

Família Portofino,

Mais um dia tenso e de extrema volatilidade nos mercados. Confesso que o fechamento me deixou um pouco mais tranquilo. O drible dado pelo governo à regra do teto deixou os mercados completamente disfuncionais nos últimos dias, hoje em especial. O anúncio da permanência do ministro Paulo Guedes na pasta da economia e as palavras de suporte vindas do presidente Jair Bolsonaro foram o gatilho para um importante ajuste dos preços dos ativos brasileiros ao longo da tarde.

A despeito da insistência na retórica de manutenção do arcabouço fiscal e respeito ao teto, a verdade é que a estratégia escolhida para acomodar o novo Bolsa Família no orçamento quebrou a confiança dos agentes. Temos um novo normal fiscal, entramos em um regime diferente. Este novo regime fragiliza o controle dos gastos dado que se perdeu a antiga âncora fiscal. Novo regime, novo cenário, novos preços. Pode soar prematuro, mas é razoável afirmar que já contratamos um ambiente de inflação ainda mais pressionada, juros estruturalmente mais altos, crescimento ainda menor para o próximo ano e câmbio mais depreciado.

Ao longo da semana que vem, começaremos a conviver com as reais consequências da decisão tomada pelo governo. O Comitê de Política Monetária – COPOM – se reúne na próxima quinta-feira para deliberar sobre a nova taxa SELIC. Até antes de toda essa crise, nosso banco central vinha sendo vocal quanto a sua estratégia de gradualismo na estratégia de condução da política monetária. O plano de voo sempre foi aplicar passos de aumento de 1%, enquanto monitorava a manutenção da ancoragem das projeções de inflação, principalmente para um horizonte de 12 a 18 meses à frente. Plano esse sempre condicionado à manutenção da austeridade nos gastos públicos.

Hoje a curva de juros futuros, considerando a melhora após o anúncio de permanência do ministro, precifica a 1,5% e é altamente provável que o  Banco Central ratifique as expectativas do mercado. Os economistas começam a revisar suas projeções e tudo indica que migrem para um final de ciclo por volta de 11% ou um pouco mais. Selic de dois dígitos, observada pela última vez no primeiro semestre de 2017. O custo econômico da decisão tomada de forma atabalhoada deverá ser bastante superior aos R$ 80 bilhões pretendidos pelos congressistas. Somente o aumento do serviço da dívida pública com o pagamento de juros maiores e menor arrecadação em função da retração da atividade superarão este montante.

Quanto ao custo político para o presidente da república, difícil de se traduzir em números, porém certamente será relevante. A conferir.

Bom fim de semana a todos.

Depois desses últimos dias, todos merecemos!

Edu Castro
Chief Investment Office
Portofino Multi Family Office

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Eduardo Castro é CIO (Chief Investment Office) na Portofino Multi Family Office.

”Causa e Efeito” é um conteúdo exclusivo para clientes Portofino que traz uma visão técnica sobre o que aconteceu no mundo, na semana e seus reflexos nos mercados financeiros globais.

Carta #108: Strangers

Carta #108: Strangers

Quem diria que chineses também tem feriados prolongados? O calendário da “Golden Week” por lá começou na segunda, com uma boa dose de delirium tremens em terras tupiniquins, por conta da síndrome de separação experimentada por desesperados usuários, de um Whatsapp inoperante.

4 Meses}
Reconheço que ando me repetindo. Mas, o faço na esperança de provocar uma reflexão útil. Relembremos as narrativas que dominaram o último quadrimestre, de Junho à Setembro. O final de junho foi atrapalhado pelo balde de água fria que representou a versão inicial da proposta de reforma tributária. Já julho padeceu de ruídos em torno do parcelamento de precatórios, votação eletrônica, e bolsa família. Em agosto, foi a divulgação da proposta de orçamento do governo para 2022, que pareceu ter azedado o finalzinho do mês. Agora em Setembro, somos surpreendidos com o susto da chinesa Evergrande, e até com uma crise energética mundial (quem diria? não estamos sozinhos!) que parecia não estar no radar de ninguém. Já como humanidade, parece que aprendemos à conviver com o desenrolar da crise Covid, ao mesmo tempo que cicatrizamos das feridas por ela causadas. Meu ponto? Me parece haver um certo mau humor desmesurado, quase um catastrofismo, que tomou conta do noticiário, e foi amplamente abraçado pelo mercado financeiro. Não quero parecer sofrer de um caso agudo de Polianismo, mas, neste curto prazo, parece haver muito ruído e pouco sinal nestes desenvolvimentos.

Conflito de Interesses
IA crise política “da semana” esteve centrada em torno dos investimentos no exterior do nosso ministro Guedes, em particular através de uma companhia de investimentos offshore. Já temos combinado aqui entre a gente, que investir além de nossas fronteiras é algo que proponho faça parte das considerações de todas nossas famílias, em proporções a serem ajustadas conforme o caso. Está posto também que o câmbio provavelmente não apresenta um momento propício para realizar grandes movimentos. No entanto, meu ponto aqui é outro. Offshores são veículos absolutamente legais, cuja declaração no IRPJ segue regras bem definidas. A crítica da mídia centrou-se num potencial conflito de interesses do nosso chefe das finanças, ao considerar o impacto de decisões econômicas em suas finanças pessoais. A chamada “teoria do agente-principal”, ou, em inglês, “agency dilemma” cobre justamente este tipo de situação onde uma pessoa (o agente) tem capacidade de tomar decisões ou executar ações que impactem à outro (o principal), e pode se ver tentado a agir em seu próprio benefício e interesse, que pode ser contrário ao do principal. Na literatura, este tipo de problema é amplamente estudado por pensadores como Danny Kahneman, e provocadores como Nassim Taleb. Independentemente da situação específica do ministro, este “conflito de agência” é presente em uma séria facetas do nosso dia a dia, e é exacerbado sempre que há uma grande assimetria informacional entre as duas partes.

Conflito de Interesses II
Me explico. Se você, como eu, adora carros antigos – sim, aqueles dotados daquele esquisito terceiro pedal, e que teimam em pingar óleo – então é forçado à frequentar oficinas mecânicas. E, à menos que você seja um entusiasta do assunto, há uma assimetria informacional enorme entre você e o mecânico. Ou seja, é muito difícil questionar um diagnóstico, ou mesmo validar o escopo de um dado serviço de reparo. Para piorar a situação, as decisões tomadas pelo agente (neste caso, o mecânico) tem impacto financeiro direto sobre o principal (o dono do veículo), já que cada peça trocada, ou cada serviço executado, é adicionado à conta final. Terreno fértil para oficinas inescrupulosas, e motivo, penso eu, que tantos de nós optamos por trocar carros assim que a garantia expira, ou mesmo partir para os sistemas de assinatura que andam se popularizando.

Conflito de Interesses III
Bem, este introito demorado me permite chegar no ponto que buscava. Serviços financeiros claramente oferecem inúmeras armadilhas no sentido de conflito de interesses. Os antigos já sabiam disso, e a frase em latim “caveat emptor” (ou “comprador, (tome) cuidado”) expressa justamente o cuidado que consumidores (investidores, neste caso) precisam exercer. Modernidades como a internet, assim como pressão regulatória, acabaram por jogar muita luz no assunto, e buscam trazer transparência e acesso rápido à informação sobre o mercado. Mas, o “senhor mercado” infelizmente teima em reagir com crescente complexidade, tecnicalidades, e jargão próprio. Penso que um dos maiores conflitos de interesse do mercado é o recebimento, de forma não divulgada ou não transparente, de benefícios, vantagens e comissões pela venda de produtos – fazendo com que o investidor eternamente se pergunte à qual interesse aquela sugestão de alocação realmente atenderia. Conflitos de interesse infelizmente são da natureza humana. Lhes deixo com minha recomendação de que sempre cobrem de seus assessores, consultores e gestores total transparência na forma como são remunerados, e um alinhamento de interesses que só é possível por aqueles que priorizam elevados padrões de conduta, como a adesão ao dever fiduciário. Para os que ainda não são nossos clientes, fica o convite para vir conhecer a tranquilidade e os resultados que uma relação transparente oferece.



Concluo esta carta mais curtinha – afinal, é sexta-feira véspera de feriado! – com uma recomendação de uma excelente série na Amazon Prime. “Nine Perfect Strangers”, traduzido como “Nove Desconhecidos”, é tanto estrelado como co-produzido pela minha diva Nicole Kidman. Os que me acompanham desde o final do ano passado se lembrarão da minha recomendação pela série da HBO “The Undoing”, na carta #64, com a mesma multitalentosa Nicole. As duas séries compartilham a curta duração, 8 episódios no caso dos 9 desconhecidos, que encaixa bem com minha auto-promessa de não enveredar por séries que me levarão anos para assistir. A trama é baseada no romance homônimo da australiana Liane Moriarty, e gira em torno do retiro espiritual proporcionado pela “Tranquilium House” – que de tranquila pouca coisa tem. Em outras notícias, aproveito para lembrar que a famosa série “Billions” voltou à filmar e lançar novos episódios, depois de ter sido interrompida no meio da quinta temporada por conta da Covid. Prometo que você vai tomar um susto ao ver o novo visual do Chuck. Já Axe permanece o vilão adorável de sempre.

Esta carta semanal tem o objetivo de fazer um apanhado breve e bem-humorado das notícias do mercado financeiro, com foco nos temas de gestão de riqueza e planejamento financeiro. O texto não constitui nenhuma oferta de produto financeiro, ou recomendação de investimento. As opiniões aqui contidas não necessariamente refletem o posicionamento oficial da Portofino Multi Family Office.

Pedro Saboia é sócio da Portofino Multi-Family Office, investidor profissional, CEA (Certificação de Especialistas em Investimentos ANBIMA) e Consultor de Valores Mobiliários autorizado pela CVM, conforme instrução 592. A Portofino cuida das pessoas para que alcancem um futuro financeiro equilibrado – com ética, transparência e responsabilidade. Quer conhecer mais? Agende uma conversa.

Causa e Efeito 08.10.2021

Causa e Efeito 08.10.2021

Família Portofino,

Mais uma semana de extrema volatilidade nos mercados! No Brasil, qual a razão de um fechamento tão forte do Ibovespa e queda nas taxas prefixadas no pregão de hoje? Nos Estados Unidos, o que explica a recuperação do SP500 das mínimas da semana?

Temos insistido na tese de que os mercados irão, no fim das contas, tentar precificar se um aumento significativo da inflação, independente se por restrição de oferta, aumento da demanda ou os dois simultaneamente, forçará os bancos centrais a anteciparem a retirada de estímulos e consequentemente antecipar a elevação dos juros. Ao fim e ao cabo, quão ameaçado estará a continuidade do crescimento das economias passado o pico da pandemia.

Localmente, depois de uma sequência de dados bastante ruins, o IPCA de setembro, divulgado hoje, surpreendeu positivamente. A mediana das estimativas apontava para 1,25% e o número divulgado registrou “apenas” 1,16%.
O índice de difusão, número que mostra o percentual dos bens e serviços que registraram alta no mês, caiu de 71,9% para 65%. É muito provável que a inflação de 12 meses em 10,25% tenha atingido o seu pico. Do lado da atividade, os dados de vendas no varejo, também divulgados durante a semana, vieram bem abaixo do esperado pelo mercado, queda de 3,1% contra uma expectativa de alta de 0,7%.

Simplificando, menos inflação e menor crescimento implicariam em um ciclo mais curto de aumento de juros. Bom para posições prefixadas e para a renda variável.

Lá fora, exceção feita ao petróleo, pudemos observar algum arrefecimento nos preços das commodities de energia, principalmente o gás natural. Nos Estados Unidos, a criação de empregos formais mais uma vez surpreendeu
negativamente.
O banco central americano tem o duplo mandato de, em simultâneo, controlar a inflação e reduzir o desemprego. Dados positivos, na margem, relativos aos preços de energia e piores quanto à criação de emprego,
no mínimo, reforçam a tese de retirada gradual de estímulos e pouca urgência para o aumento dos juros. Mais crescimento com inflação controlada, mesmo que em níveis historicamente mais altos, é bom para ativos de risco.

A sexta-feira termina mais positiva, sem dúvida. Será essa dinâmica de maior ou menor inflação, juros e crescimento que continuará ditando a volatilidade dos mercados, sempre dependente dos dados a serem divulgados ao longo do tempo e da continuidade ou não da recente pressão nos preços das commodities.

Semana que vem tem mais!
Edu Castro
Portofino Multi Family Office

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Eduardo Castro é CIO (Chief Investment Office) na Portofino Multi Family Office e semanalmente escreve a carta
”Causa e Efeito”. Um conteúdo descomplicado, com a sua visão técnica e reflexiva sobre o que aconteceu no mundo e os reflexos nos mercados financeiros globais. Aproveite a leitura!

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Carta #104: Plaid

Carta #104: Plaid

Semana curta nos mercados financeiros, com o feriado de “labor day” nos EUA, na segunda-feira, e nosso feriado nacional na terça, porém com forte carga emocional e política.

Para completar, amanhã temos o aniversário de 20 anos dos ataques de 11 de setembro (“9/11”) aos EUA. Ainda que me lembre como se fosse ontem, me dei conta que há toda uma geração de jovens para quem a data talvez tenha pouca relevância. Na época, ainda durante minha carreira corporativa, era responsável por TI em uma multinacional de telecom. Além de traumático em mais níveis do que se possa imaginar, o evento inaugurou uma nova era de foco empresarial em planejamento de contingência, e recuperação de desastres.

Na busca por fazer sentido de uma semana tão desconcertante e beligerante para nosso pais, recorro novamente à uma citação atribuída ao escritor Mark Twain: “I’ve lived through some terrible things in my life, some of which actually happened.” – numa tradução livre, “já passei por coisas terríveis em minha vida, algumas das quais realmente ocorreram”.
Mares Revoltos
Na carta passada comentei sobre os impactos da situação atual na performance recente de nossos investimentos. A temperatura aumentou depois das falas do presidente no dia 7, causando repiques expressivos nos juros futuros e no dólar, e uma queda significativa de 3,78% na bolsa. No dia seguinte (ontem), ao final da tarde, uma nota oficial interrompeu a escalada do pessimismo e, até o momento em que escrevo estas linhas, parece querer permitir um fechamento de semana mais tranquilo. Ainda que estejamos muito longe do caos instalado em Março de 2020 por conta da eclosão da Covid, há lições que podemos trazer para o momento atual. Minha recomendação é que adotemos a mesma postura daquela época, e isso quer dizer preservar a calma e manter o curso em termos de estratégias de investimento. Insisto, não é nem polianismo (positividade exagerada) nem o que os americanos chamam de efeito “deer in headlights”, quando cervos ficam petrificados pelas luzes de faróis, incapazes de sair da frente do automóvel que se aproxima. A sólida construção de portfólio, aliada à uma gestão ativa, mostra seu valor principalmente nos momentos de stress.
NFT
Desde a carta #80, quando tentei (creio que em vão), explicar o que são NFT´s (“non-fungible tokens”), tenho me cobrado uma forma mais didática de retornar ao assunto. O mercado financeiro é ambiente fértil para inovações em termos de ativos negociáveis, e NFT´s talvez sejam o expoente da vez. Esta semana, numa brincadeira com minha filha mais velha, nos lembramos do fenômeno que foi o bichinho de estimação virtual “Pou”. Uns 7 anos atrás, numa longa viagem ao interior, minhas filhas me infernizaram para deixá-las “investir” 2 reais na compra de um bichinho destes, que precisa ser virtualmente alimentado e cuidado para que cresça saudável. Qualquer semelhança com os chaveirinhos tamagotchi lançados no Japão na segunda metade dos anos 90, não é mera coincidência. Pois bem, o tal Pou não é tecnicamente um NFT, já que, por não ser único, é fungível. No entanto, o arquivo digital da imagem do Pou original poderia sim ser um ativo exclusivo, e portanto passível de negociação (e até eventual especulação) por parte de colecionadores. Deixo de dever de casa ao leitor googlar a foto do tal bichinho, já que o decoro editorial me impede de incluí-la aqui! 
Bitcoin
Um assunto que me parece passou desapercebido esta semana foi a confusão em El Salvador com a adoção do bitcoin como moeda oficial. A “Ley Bitcoin”, aprovada em junho deste ano, estabeleceu 7 de setembro como a data a partir da qual a criptomoeda seria aceita oficialmente no país. Pessoalmente, me parece uma experiência ousada. O “senhor mercado” parece concordar, já que naquele dia a moeda teve uma queda do patamar de 52 mil usd para 47 mil – ou algo como 10%. Do ponto de vista do povo daquele pais, seria como ver o dólar que hoje ronda os 5,20 reais saltar para 5,70 – de um dia para o outro! Já sob a ótica de relevância mundial para a validação desta criptomoeda, sinceramente acho que um evento mais significativo seria ver o Sr. Musk (Tesla) voltar à aceitar bitcoins pelos seus carros.
Risco, Episódio 2
Retomo o assunto da definição da palavra “risco”, no contexto de investimentos. Meu primeiro objetivo é sustentar a tese de que o grau de variação nos preços de um ativo não serve como uma boa medida de risco, ou pelo menos não de forma isolada. Para tanto, faço o uso do artifício da contraprova, buscando exemplos de ativos cuja falta de “balanço” não os torna necessariamente de baixo risco, e vice-versa. Imaginemos que meu leitor empreste 100k para seu cunhado (sempre eles!), por 12 meses, à um juros camarada de 10% ao ano. Se você é como eu, faria uma contabilidade mensal de tal ativo em sua planilha, capitalizando-o à 0,8% ao mês. Zero de variabilidade, com total expectativa de receber os 110k um ano depois. Lá pelo décimo mês, num almoço de domingo, você descobre que talvez os recursos atrasem “um pouco” para serem devolvidos – talvez até “um muito”. Aquilo que era uma rentabilidade certa, com nenhuma variação mensal, corre o risco de virar um write-off (baixa contábil). Exagero? Infelizmente, milhares de investidores na debenture de uma concessionária de rodovias sofrem atualmente do mesmo cenário. 
Riscos, Episódio 3
Adiantando as cenas dos próximos capítulos, falemos de imóveis. Imóveis são o tipo de ativo onde a gente raramente contabiliza variação em preço, especialmente naquela nossa planilha da ativos pessoais. Talvez, anualmente, façamos alguma previsão de ganho, com base nas condições de mercado, mas a maioria dos investidores que conheço prefere ser conservador e deixar o preço originalmente pago como base – aquele que consta no IR. Pois bem, podem transcorrer anos em que o valor daquele ativo permanece inalterado – de novo, zero de volatilidade. Agora, imaginemos um cenário neurótico em que, a cada dia, perguntássemos ao zelador do prédio, ao corretor de confiança, e àquele vizinho enturmado, qual o preço do metro quadrado das últimas ofertas e transações fechadas, atualizando nossa estimativa. Veríamos um preço de ativo com enorme variabilidade diária, ao sabor de descontos, benfeitorias, e oportunidades especiais, que em nada mudaria o fato de que imóveis são, em sua maioria, bens de baixo risco.



Esta semana, faço uma mudança de marchas brusca, e literal, para falar não de música ou cinema, e sim de carros. A dica da semana é pelo video de lançamento do “Tesla Model S Plaid”, disponível aqui. Os que me conhecem bem sabem que, posso até ser forçado à ter um elétrico nesta vida, mas, carro para mim tem que ter cambio manual, folga na caixa de direção e pingar óleo. Entretanto, impossível não tirar o chapéu para a incrível criação de Musk, quebrando a barreira dos 0 a 100 km/h abaixo de 2 segundos. Além do vídeo de apresentação, o youtube, na sua infinita busca por tomar um pouco mais do meu tempo livre, tem sugerido incontáveis vídeos de amadores testando a arrancada da máquina. Por falar em máquina, impossível não achar que o volante do Plaid é uma cópia do volante do K.I.T.T. do Knight Rider (“A Super Máquina”, seriado americano dos anos 80). E o nome do carro? Bem, aparentemente tanto a velocidade “ludicrous”, como o nome “plaid” são emprestados do filme Spaceballs  (“Tem um Louco Solto no Espaço”) de 1987 – uma divertida paródia ao filme Star Wars. O clip da cena em que ambos termos aparecem pode ser conferido aqui. Pelo jeito, Elon é tão fixado nos anos 80 quanto eu!

Esta carta semanal tem o objetivo de fazer um apanhado breve e bem-humorado das notícias do mercado financeiro, com foco nos temas de gestão de riqueza e planejamento financeiro. O texto não constitui nenhuma oferta de produto financeiro, ou recomendação de investimento. As opiniões aqui contidas não necessariamente refletem o posicionamento oficial da Portofino Multi Family Office.
Pedro Saboia é sócio da Portofino Multi-Family Office, investidor profissional, CEA (Certificação de Especialistas em Investimentos ANBIMA) e Consultor de Valores Mobiliários autorizado pela CVM, conforme instrução 592. A Portofino cuida das pessoas para que alcancem um futuro financeiro equilibrado – com ética, transparência e responsabilidade. Quer conhecer mais? Agende uma conversa.

Carta #108: Strangers

Carta #103: Balanço

Semana novamente dominada pelo agravamento de temas locais recorrentes: descompasso fiscal, reformas erráticas, embates políticos, e uma crise energética que parece cada vez mais certeira.

No calendário, temos um feriado de 7 de setembro na terça que vem carregado de polarização e incerteza. E, o final da semana, mais precisamente sábado dia 11, marca o aniversário de 20 anos da tragédia de 9/11 nos EUA. 

Permito-me repetir o comentário que fiz na carta #79, em março deste ano, quando as médias diárias de óbitos devido à Covid rapidamente se aproximavam de 3000: “O mundo parou para olhar aqueles ataques às torres gêmeas, enquanto sites de notícias congelavam sob o peso da humanidade tentando entender o que acontecia. Aqueles eventos, que aterrorizaram o mundo e inauguraram uma nova era do medo, contabilizaram 2,977 mortes.

Prometo me esforçar ao máximo em buscar um olhar positivo e construtivo para os temas que selecionei.

Final de Mês
Comecemos pelo bode na sala. Sob qualquer medida, tivemos mais um final de mês de resultados pouco inspiradores para nossos investimentos. Classes de ativos de risco universalmente sofreram sob o peso de tantas notícias negativas. Na minha fatura, estamos já há 3 meses contabilizando finais de mês desapontadores. Desde aquela sexta-feira, 25 de junho, onde o powerpoint da proposta de reforma tributária começou a circular, mercados não tem tido trégua. Se o final de junho foi atrapalhado pelo balde de água fria que representou a versão inicial da proposta, o término de julho padeceu de ruídos em torno do parcelamento de precatórios, votação eletrônica, e bolsa família. Em agosto, apesar da semana passada (carta #102) ter terminado em tom positivo, a divulgação da proposta de orçamento do governo para 2022, admitidamente ainda muito crua, parece ter azedado o finalzinho do mês. “No creo en brujas … ”, mas parece haver um esforço cósmico concertado de divulgação de pautas bombas no final de mês – especialmente quando, por exemplo, bolsas americanas vivem um excelente momento. Minha recomendação? Fiquemos alertas à amplamente documentada fixação do ser humano pelas notícias ruins. Ainda que o viés da negatividade tenha nos trazido até aqui como espécie, talvez devamos ficar alertas à seus efeitos acumulados, quando somos bombardeados pelo fluxo incessante de notícias. Afinal, e sem nenhuma crítica implícita, como dizem nossos vizinhos do norte, “bad news sells”.



Reforma Tributária
Fomos surpreendidos na quarta à noite com a aprovação às pressas da reforma do IR na câmara. O famoso investidor fundamentalista Benjamin Graham (1894-1976) certa vez declarou que “In the short run, the market is a voting machine but in the long run it is a weighing machine.” Ou seja, o curto prazo estaria muito mais próximo de um concurso de popularidade, sendo que no longo prazo o real valor das ações “pesaria”, refletido no preço. Bem, ontem, quinta-feira, o “sr. mercado” votou… e votou pesado, ao tom de uma queda de 2,28% no índice Ibovespa – e com reflexos no mercado de juros. Pelo andar de hoje, as urnas continuam abertas. Claramente é um assunto para acompanharmos de perto, agora que a reforma segue para o senado. No entanto, a forma atabalhoada como o assunto foi conduzido não agradou ninguém. O brilho de uma medida estimulativa, a redução do IR das empresas, parece ofuscado pelos inúmeros efeitos de segunda ordem, e eventuais desarranjos econômicos, que assuntos como a tributação de dividendos pode trazer. Seguimos mapeando os impactos nas diversas classes de ativos que recomendamos, e nossas portas permanecem abertas para famílias que desejem explorar situações específicas.

Orwelliano
No começo da semana foi divulgada uma notícia que ganhou pouca atenção, porém que creio reforça a visão de uma China cada vez mais reguladora daquilo que o partido entende como “ópio espiritual” (carta #99). Aparentemente, a China estaria limitando o número de horas que crianças podem jogar online à 3… por semana! Não apenas isso, os horários permitidos para tais atividades também seriam restritos. Como pai de duas adolescentes plugadas, neste caso não em jogos mas em TikTok e Insta, secretamente comemorei a notícia. Mandei imediatamente para elas por nosso grupo familiar de whatsapp, ação que foi recebida com um gélido episódio de “ghosting” – em português: deram de ombros. Sinceramente não tenho a menor ideia de como o partido pretende implementar tal política. Independentemente disso, há um certo ar de “1984” (romance distópico de George Orwell) no ar, indo desde bitcoin e sistemas de pagamento, passando por educação e terminando em entretenimento. China continua sendo uma tese de investimento internacional importante, mas claramente exige que percebamos que as coisas por lá funcionam diferente do que provavelmente estamos acostumados.

Riscos, Episódio 1
Prometi iniciar uma minissérie sobre o tema risco. Já fui questionado sobre esta divisão artificial de temas mais complexos em várias cartas. Se de um lado odeio o fenômeno das cenas dos próximos capítulos, do outro, trabalho duro para fazer esta leitura semanal caber em poucos minutos do final de dia do meu leitor. Mas, vamos lá: tendo concluído a exploração sobre o que seriam retornos razoáveis esperados, e fazendo a ponderação sobre o nível de risco assumido por uma dada família, é natural que surja a dúvida: afinal, o que é risco? Como se mede? O que come, e onde habita? Comecemos por algo que o risco não é, ou pelo menos não é necessariamente. Proponho aqui que volatilidade (ou o grau de variação de preços) de um certo ativo não é necessariamente uma boa medida de risco. Peguemos emprestado um exemplo da engenharia: asas de avião não são rígidas. Olhando pela janela do avião, vê-se claramente que há intensa flexão destas enormes estruturas.  As asas de um moderno Boeing Dreamliner 787 conseguem fletir incríveis 7,6 metros antes de entrar em falha – muito acima de qualquer cenário normal de operação. Neste caso, uma estrutura rígida seria muito mais arriscada do que o projeto atual. Um certo grau de flexibilidade (volatilidade), dentro de limites, não é apenas esperado, mas faz parte integral do projeto. Pontes e edifícios altos são projetados considerando este mesmo princípio. História curiosa, para cariocas saudosistas como eu: o famoso e controverso edifício “balança mais não cai”, inaugurado em 1948, na época de Vargas, está de pé até hoje, devidamente revitalizado, e inspirou até programa humorístico na Globo dos anos ‘70 !



Sei que arrisco alienar alguns queridos leitores com a dica desta semana, mas, ainda que filmes de terror não sejam de apelo universal, minha recomendação tem uma história por trás, e vem com pedigree de ninguém menos que o famoso escritor Stephen King. Voltemos ao ano de 1980. Jack Nickolson e Shelley Duvall estrelavam em “The Shining” (“O Iluminado”) de Stanley Kubrick. As coisas demoravam para chegar no Brasil naquela época, então eu provavelmente vi o filme lá por ’83, numa fita VHS, já adolescente e relativamente interessado neste tipo de estética. “The Shining” talvez tenha sido o primeiro filme do gênero a alcançar grande projeção mainstream, provavelmente pela brilhante atuação do ensandecido Nicholson, e pela hábil direção de Kubrick (sim, o mesmo de “Laranja Mecânica”). Assistir à película era visto como um rito de passagem para os interessados no gênero, com lendas urbanas especulando que nunca mais seríamos os mesmos. Pois bem, a dica da semana fica com “Doctor Sleep” de 2019, que é justamente baseado no livro de King que é a sequência à história que inspirou o original. Ainda que não seja uma obra-prima tão chocante como a primeira, o enredo, com quase 40 anos, envelheceu bem e retoma a trama do ponto de vista do filho do casal original. Ewan McGregor, até onde me lembro, estreia no gênero. Mesmo que meu leitor não ame o estilo, Stephen King é um ícone da literatura americana, e as adaptações à telona costumam honrar a obra original. Eu só encontrei na HBO, aquela do catálogo excelente mas do app de streaming sofrível. Se precisar de companhia para assistir, como eu precisei lá no começo dos anos ’80, pode encomendar a pizza e me chamar!

Esta carta semanal tem o objetivo de fazer um apanhado breve e bem-humorado das notícias do mercado financeiro, com foco nos temas de gestão de riqueza e planejamento financeiro. O texto não constitui nenhuma oferta de produto financeiro, ou recomendação de investimento. As opiniões aqui contidas não necessariamente refletem o posicionamento oficial da Portofino Multi Family Office.
Pedro Saboia é sócio da Portofino Multi-Family Office, investidor profissional, CEA (Certificação de Especialistas em Investimentos ANBIMA) e Consultor de Valores Mobiliários autorizado pela CVM, conforme instrução 592. A Portofino cuida das pessoas para que alcancem um futuro financeiro equilibrado – com ética, transparência e responsabilidade. Quer conhecer mais? Agende uma conversa.